Não há poesia

Esta quadra enforcada
Foi à força retirada
Da minha imaginação.
Pois estava mais a minha amada
Em noite já bem jantada
E sem alma de versejão.

Mas, senhor, queria ela poesia
Que lhe compensasse a agrura do dia
E tanta agitação.
Porém, isso ele não queria
Pois para ele a poesia
Já lhe causava comichão.

E respondeu-lhe mal inspirado
Para ver se a calava:
Que se fosse versejar
Ficava o caldo entornado
E nunca mais com ela jantava.

«E nem que para aí praguejes
E ameaces que te matas
A minha boca não se abrirá
As quadras são umas chatas.
E as palavras são sarnentas
Apegam-se-nos às ventas
Não se lhe pode fugir.»

Assim, em vez da poesia
Veio a noite e foi-se o dia
E foram mas foi dormir.

terra absoluta sob céu imóvel

A terra absoluta é que segura
o céu absoluto
as nuvens, imóvel.

Uma terra escanhoada
de pilares invisíveis
e que as cigarras procuram
na ilusão duma sombra.

Uma terra de terra
esboroada pelo tempo
e pelos homens
que caminham
sem direcção.